Acontece que ela não é uma escritora, apenas uma pessoa um pouco perdida, pelo que o exercício ficcional reiterado não lhe traz elogios da crítica, mas a censura branda do psicanalista. Imaginá-lo uma alma gémea, alguém que não resiste um dia a vir até ali interrogar-se sobre que rumo teria tomado a sua vida se tivesse comparecido ao encontro, faz parte da patologia dela e é uma nova motivação para a saída de sábado à tarde. Que se junta à já de si suficiente tendência para remoer frustrações com método.
Hoje, porém, está prestes a descobrir que as coisas podem mudar. Parou como sempre na entrada da ponte, para consultar o telemóvel e perscrutar o horizonte num gesto ritual, evocativo, fingindo uma pausa para beber água e retomar o fôlego. Sempre pensou que se o encontrasse a meio de uma das suas caminhadas a visão dele seria suficiente para a deter. Mas, porque ela está de momento parada e ele vem com o braço pelo ombro de uma qualquer, o princípio fundamental da dinâmica será demonstrado de forma diferente: quando ela os vê, sente um desejo súbito de experimentar o jogging e sai a correr na direcção da força que emana do casal, mas em sentido contrário à localização deles.
Se a força gravitacional dos corpos pode ser uma boa imagem para descrever o amor, a segunda Lei de Newton pode talvez usar-se com igual propriedade para assinalar a evolução desportiva de uma rapariga magoada.
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