domingo, 28 de junho de 2015

17


Ia propor-me oferecer um exemplar d’Os Idiotas ao primeiro leitor ou leitora que decifrasse o cabalístico 17 que se vê na foto, mas percebi que o exercício era em si idiota, por redundante. Decerto todos os que conhecem a importância do 17 na mitologia deste blogue são já detentores do livrinho.

domingo, 21 de junho de 2015

Uma epifania todoroviana para Marco António Costa

Num daqueles vídeos que nos aparecem no Facebook e que às vezes, por qualquer indução subliminar tecnológica ou simples tédio existencial, não resistimos a espreitar, vi Helena Roseta servir-se vagamente da poesia num debate político televisivo e um Marco António de barba aparada e gravata sem mácula rejeitar essa via ingénua e inútil, subordinando-a naturalmente ao pragmatismo sério — talvez adulto, para usar a terminologia do FMI — e salvífico da economia.

Tzvetan Todorov é um búlgaro que foi estudar em Paris nos anos do bloco comunista. Para passar nos testes que lhe davam acesso à cidade luz, precisava de falar de literatura nos termos que a ideologia comunista impunha: era preciso mostrar de que forma os escritos analisados ilustravam a boa ideologia ou como falhavam em fazê-lo. Para não ter de entrar nesse exercício simultaneamente estranho e constrangedor, Todorov, como tantos outros, escreveu um trabalho que abordava a materialidade do texto e as suas formas linguísticas. Seguiu, já se vê, a via do estruturalismo (aliás viçoso à época e vicejante em todas as décadas seguintes), via que seria a sua na carreira universitária que então iniciou em França.

Posteriormente, num livrinho intitulado «A literatura em perigo» (2007), que por coincidência hoje dei por mim a ler, o mesmo Todorov nota que o seu subterfúgio para não discutir a literatura nos termos do regime se tornou afinal a norma no ensino francês (e europeu), que não tinha a mesma necessidade de tergiversar. Todorov alerta para o absurdo que é ensinar e aprender literatura em função da forma e das estruturas dos textos em vez de o fazer primariamente a partir daquilo de que as obras falam, do seu sentido.

Marco António e um bom lote de políticos e economistas europeus são uma espécie de semióticos da actual ideologia dominante. Só podemos desejar que tenham depressa a sua epifania todoroviana sobre o verdadeiro sentido da existência humana e da vida em comunidade. Talvez isso não salve o euro, mas poupa-nos a um pretensiosismo estéril e patético.